Avizinha-se um tempo de escolhas...

... que inevitavelmente acarretam mudanças… e inconscientemente dou por mim a pensar…

- Como teria sido se não tivesse vindo trabalhar para um bairro social a muitos quilómetros de casa?

Se não tivesse vindo trabalhar para um bairro social a muitos quilómetros de casa, não teria revivido memórias perigosa e dolorosamente recentes, não teria voltado para junto de locais e pessoas que só queria esquecer… para depois concluir que é possível enterrar um passado e conviver bem com ele, desde que se mantenha assim  –  enterrado! ...

Se não tivesse vindo trabalhar para um bairro social a muitos quilómetros de casa, não teria que voltar a morar num quarto alugado… para depois concluir que aquilo que aos vinte anos se leva com leveza e humor, aos trinta acaba por aborrecer e incomodar…

Se não tivesse vindo trabalhar para um bairro social a muitos quilómetros de casa, não teria conhecido profissionais fantásticos, experimentado novas formas de trabalhar… mas não teria também verificado que se pode ser claro e parecer ambíguo, que muitas vezes se confunde experiência com competência, intransigência com inteligência, discórdia com ideia de grupo… para depois concluir que isso é só trabalho e Deus me livre de um dia isso se tornar a minha única prioridade…

Se não tivesse vindo trabalhar para um bairro social a muitos quilómetros de casa, não teria conhecido pessoas lindas, amigos para sempre… para depois concluir que o meu coração tem capacidade ilimitada para novos inquilinos, mas que os que já lá habitavam não se atrasam com o pagamento da renda nem um diazinho!...

Se não tivesse vindo trabalhar para um bairro social a muitos quilómetros de casa, não teria sofrido um despiste e desfeito o carro que tanto adorava… e se isso não tivesse acontecido não teria comprado um outro que nunca me satisfez… e foi preciso baterem-me nesse outro para depois concluir que afinal gosto muito dele… e já tenho saudades!

Se não tivesse vindo trabalhar para um bairro social a muitos quilómetros de casa, não o teria conhecido, nem teria confundido amizade com amor… para depois concluir que a Amizade não é mais do que o verdadeiro amor, porque é esse o amor calmo, verdadeiro, puro… porque não é posse, nem exigência, nem obrigação…

Se não tivesse vindo trabalhar para um bairro social a muitos quilómetros de casa, não teria pensado nunca na minha casa como um pesado encargo, nunca a teria encarado como uma simples casa de férias (e sobretudo de fins-de-semana…), nem teria nunca ponderado a hipótese de repensar planos e refazer caminhos… para depois concluir que a Terra que escolhi para “minha” continua a sê-lo (pelo menos para já!), que tenho a certeza (nunca) absoluta de que é lá que quero ficar e que tenho muitas saudades da minha casa!!! ...